Ao que parece, e por razões médicas, os homossexuais estão cordialmente impedidos de doar sangue – não perguntem. Por essa razão, a secretária de Estado da Igualdade, a dra. Elza Pais, veio desafiar o presidente do Instituto Português do Sangue (IPS) a retirar dos questionários as perguntas relativas à orientação sexual dos dadores, por considerar que estas são «discriminatórias». Don’t ask don’t tell, parece ser o lema.
Impossível não concordar com o desafio. Principalmente para alguém que já foi dador. Fui. Não sou. E não sou por três simples razões. Primeiro, porque o estado de letargia crónica induzido pela perda de meio litro de sangue não é particularmente agradável. Segundo, porque o lanche que é candidamente oferecido à saída é algo a que até os piores criminosos estão poupados. Terceiro, porque o dito inquérito a que qualquer um está condenado não cai bem em almas puritanas como a minha.
Porque o acto de descortinar a orientação sexual é o menor dos males a que uma personagem caridosa está condenada. Pior é a aparentemente necessária inquisição pidesca acerca do número de parceiras – as passadas, as presentes e as futuras; de se a sedução implica a troca de dinheiro ou de meras mentiras; de se a segurança do acto é pré ou pós vitoriana; de se a posição é a sancionada, a duração a recomendada e a satisfação a desejada. A isto, claro, se chama o historial médico.
É claro que, bem a ver, tudo isto não passa de uma filmografia pessoal. Ao contrário do que a dra. Elza Pais gosta de pensar, os questionários não originam um simples problema de «discriminação». Na verdade, e mais tragicamente, eles denunciam um problema mais grave de pura devassa da privacidade pessoal. Por isso, e até que essa evidência seja percebida, a doação de sangue, mais pergunta menos pergunta, não deixará nunca de continuar a ser um mau filme pornográfico, onde cada um está incessantemente condenado a desempenhar o papel principal. E que os homossexuais estejam «discriminatoriamente» proibidos por lei de relatar as suas carreiras íntimas a um perfeito desconhecido de bata branca, não deixa de ser algo que os deverá alegrar.
Verdade.
ResponderEliminarDoar sangue e perguntarem-me como é a minha vida sexual? Acho que é, a meu ver, um atentado à privacidade.
No meu caso, é até um atentado à sanidade do próprio entrevistador.
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